Você está aqui

1ª CRDSS foca debate nos determinantes do Nordeste

De 2 a 4 de setembro, ocorreu no Mar Hotel, no Recife, a 1ª Conferência Regional sobre Determinantes Sociais da Saúde (CRDSS). O evento, transmitido pelos portais DSS Brasil e DSS Nordeste, alcançou aproximadamente 6 mil acessos on-line. O evento contou com a presença de representantes do governo, sociedade civil, academia e especialistas da área de saúde. Na abertura, o secretário de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, Jarbas Barbosa, lembrou a importância dos temas em foco na CRDSS e a necessidade de enfrentar iniquidades que ultrapassam a relação saúde-doença, citando o elevado número de mortes por violência e acidentes de trânsito. “Esta conferência vai debater tanto os determinantes sociais da saúde que persistem como os novos, que são a violência e os acidentes. Atualmente, são os grandes responsáveis por não termos aumentado a expectativa de vida dos brasileiros.”

Também presente à mesa que abriu o evento, a presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Maria do Socorro de Souza, citou a representatividade histórica da região, bem como o paradoxo que suas características sociais e estruturais revelam. “O Brasil começou pelo Nordeste. A região é o berço da formação social e política. Temos uma região rica e pobre, moderna e atrasada, com uma sociedade organizada e muita gente ainda vivendo em submissão, temos aqui uma oportunidade ímpar de discutir políticas públicas para melhorar a qualidade de vida do povo”, situou ela.

Após a abertura, foi realizada a conferência magna Nordeste: desenvolvimento recente, desafios para o futuro, com Tânia Bacelar de Araújo. Segundo ela, o padrão de crescimento brasileiro beneficiou a região Nordeste, que, em determinados casos, chegou a superar a média de avanço do país. “A elevação da renda estimulou o consumo, e associamos isso ao crédito. Como deu certo combinar a elevação de renda com juros tão altos? Isso dinamizou a economia. Quando o consumo teve estímulo, o Brasil cresceu”, apontou ela.

No segundo dia de conferência, foram promovidas cinco sessões temáticas. Na primeira, com o tema Água e saneamento, entraram na pauta a importância da desinfecção e distribuição da água no Nordeste, o acesso à água de qualidade pela população local e uma política de tratamento de esgoto que atinja a maior parte do território da região. Estiveram presentes aos debates, Everaldo Resende Silva, do Departamento de Engenharia de Saúde Pública/Funasa, Hyperides Pereira de Macedo, do Sindicato de Arquitetura e Engenharia, e Raquel Rigotto, da Universidade Federal do Ceará. A coordenação esteve aos cuidados de Maria Julita de Sá Formiga, da Compesa.

Na segunda sessão, abordou-se o tema Grandes projetos e seu impacto na saúde. O alcance de projetos na região nos âmbitos cultural, social e de saúde pública foi discutido, bem como a interferência do desenvolvimento na ampliação das desigualdades. Sob coordenação de Paulo Guimarães, chefe do Departamento Nordeste do BNDES, a mesa reuniu Paulo Sabroza, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Gustavo Nogueira, do Conseplan, e Ângelo Zanré, da Cáritas do Brasil.

A terceira sessão focou Acesso e qualidade dos serviços de saúde. Dela participaram Helvécio Miranda, da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Ligia Bahia, da UFRJ, e Jairnilson Silva Paim, da Universidade Federal da Bahia. O modelo de saúde privada e o papel do SUS e seu fortalecimento foram tópicos que ganharam destaque nas exposições dos membros da mesa. “Acho que temos que radicalizar na luta pela reforma sanitária, pelo SUS”, defendeu Paim. “Do ponto de vista relativo, com tudo o que está dentro do SUS, nós ainda perdemos para o setor privado”, completou. “O que vem se observando no Brasil é a ‘americanização’ da política social brasileira. O modelo residual do assistencialismo é algo do século XVII”, exemplificou.

Lígia Bahia ressaltou a importância da observação global de dados, resultados e necessidades na área da saúde pública, e não apenas dos avanços. “Não temos só notícias boas a dar. A privatização é uma péssima notícia, e isso é política pública”, disse ela. O debate também abordou a questão das diferenças entre a parcela da população que pode pagar por serviços de saúde ou possui convênios e aqueles que não têm acesso a eles.

Com o tema Violência e drogas, a quarta sessão reuniu Ângela Cristina Santos Guimarães, da Secretaria Nacional da Juventude/Secretaria-Geral da Presidência da República, Preto Zezé, presidente nacional da Central Única das Favelas (Cufa), e Maria Cecília Minayo, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, da Fiocruz. Durante o debate, foi exibido o trailer do documentário Selva de Pedra: fortaleza noiada, produzido por Zezé.

O filme mostra o consumo de crack em Fortaleza. Ele destacou a necessidade de olhar para o problema do avanço do consumo de crack fora do contexto policial e de forma mais humanizada e real. “Chegamos a 2013 com ações governamentais extremamente tímidas sobre o problema. Isso nos preocupa muito, pois não estamos vendo uma política atrelada às parcerias com a sociedade. Não estou dizendo que nada foi feito, mas, diante da dimensão do problema, o que foi feito é muito pouco”, lembrou.

Por sua vez, a quinta sessão destacou a Segurança alimentar e nutricional e inclusão produtiva. Participaram dos debates Patrícia Jaime, coordenadora de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde, Valter de Carvalho, presidente da Associação de Orientação às Cooperativas do Nordeste e gestor de projeto de social e produtivo apoiado pelo BNDES, e Malaquias Batista Filho, da Universidade Federal de Pernambuco. Patrícia destacou a importância de cuidar da segurança alimentar das crianças, medida que pode prevenir danos à saúde com reflexos na vida adulta, promovendo o crescimento de uma população mais saudável.

Relatores apresentaram, no terceiro dia, suas descrições e comentários sobre as sessões temáticas, discorrendo sobre os diferentes temas.

O desenvolvimento de políticas públicas com a participação popular para a promoção da equidade e a necessidade de se pensar uma nova forma de governança foram destacados pelo coordenador do debate e da CRDSS, Alberto Pellegrini Filho, na última mesa da conferência. “Nesses três dias de discussões, ficou claro que o enfrentamento dos determinantes sociais da saúde exige uma nova governança. Combatê-los implica promover a distribuição de poder e recursos, o que não se faz sem a participação dos diversos setores da sociedade”, ressaltou

O evento foi encerrado por Sinval Brandão, diretor da Fiocruz Pernambuco, que leu "Carta do Recife", documento final da CRDSS. O documento pode ser acessado aqui.

Acompanhe a cobertura completa da 1ª CRDSS nos portais DSS Brasil e DSS Nordeste.

*Jaqueline Pimentel é jornalista do Centro de Estudos, Políticas e Informação sobre Determinantes Sociais da Saúde (Cepi-DSS/ENSP/Fiocruz).