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Sobrecarga de trabalho afeta saúde de policiais no RJ

Até que ponto os desgastes físicos e mentais do trabalho interferem na saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro? De acordo com um grupo de pesquisadores do Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Carelli (Claves/ENSP), uma série de situações relacionadas à sobrecarga de trabalho, aos constantes riscos submetidos e às relações tensas e conflituosas da profissão podem ocasionar significativa interferência. No artigo Fatores associados ao sofrimento psíquico de policiais militares da cidade do Rio de Janeiro, tais questões foram investigadas a partir de estudo transversal com 1.120 policiais, e a prevalência de sofrimento psíquico foi constatada em 35,7% deles.

A pesquisa foi publicada na revista Cadernos de Saúde Pública (fascículo 28, número 7), em artigo assinado pelos pesquisadores Edinilsa Ramos de Souza, Maria Cecília de Souza Minayo, Juliana Guimarães e Silva e Thiago de Oliveira Pires, do Claves/ENSP. De acordo com eles, no caso específico dos policiais militares, o nível de estresse tem sido apontado como superior ao de outras categorias profissionais, não só pela natureza das atividades que realizam, mas também pela sobrecarga de trabalho e as relações internas à corporação, cuja organização se fundamenta em hierarquia rígida e disciplina militar.

No Rio de Janeiro, a maioria dos policiais militares é do sexo masculino (96,3%), está na faixa etária dos 31 aos 40 anos (43,1%), 48,2% são pardos e 75,4% são casados. Esses fatores, segundo o artigo, também contribuem para o sofrimento psíquico dos PMs. “No tocante aos policiais militares do Rio de Janeiro, as condições de saúde e de trabalho tendem a ser extremas, pois eles lidam com elevados índices de criminalidade de grupos organizados de criminosos armados. Os constantes riscos a que o policial militar se expõe, em função do exercício da profissão, levam-no em geral a sentir medo, por si mesmo e por sua família, tanto de ser reconhecido como agente da segurança nos períodos de folga do trabalho, quando aumenta seu risco de vitimização, como de ser agredido e morto no desempenho de suas funções”, afirma o texto.

Estudo propõe reflexão sobre salários e condições de vida

Na opinião dos pesquisadores do Claves, esse medo é uma forma de defesa do corpo e do espírito dos que vivem sempre alerta aos perigos. No entanto, quando o estado de tensão e o desgaste físico e emocional são constantes, eles podem gerar diversos prejuízos à saúde e à qualidade de vida; dentre eles, estresse e sofrimento psíquico. “A análise verificou prevalência de sofrimento psíquico em 35,7% dos policiais militares da cidade do Rio de Janeiro. Em relação ao tempo de trabalho, 13,2% dos que estavam há dez anos na corporação apresentavam sofrimento psíquico, contra 24% dos que trabalhavam de 11-20 anos e 16,2% dos que tinham mais de vinte anos na polícia.”

O modelo logístico elaborado demonstrou que fatores como capacidade de reagir a situações difíceis, grau de satisfação com a vida, comprometimento da saúde física e mental, carga excessiva de trabalho, exposição constante ao estresse e à vitimização influenciam sobremaneira o desenvolvimento de sofrimento psíquico nesse grupo de profissionais.

Tais constatações, no entanto, vão além do processo de trabalho em si de acordo com o estudo, pois suscitam reflexões acerca dos salários, do processo de organização institucional, dos cuidados dispensados à saúde e das condições de vida pessoais e familiares desses servidores. “Merecem atenção especial os policiais que, pelas suas características de personalidade e pelo excesso de exposição ao risco e à vitimização, desenvolvem sintomas agudos e crônicos de sofrimento e de estresse cumulativo”, concluíram os pesquisadores.