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Encontro debate impacto e regulação dos agrotóxicos
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"A questão do agrotóxico é complexa: não pela substância em si, mas sim por ser esse produto um componente relacionado à lógica internacional do capitalismo", esclareceu o pesquisador do Centro de Estudos em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh/ENSP) Ary Miranda. A apresentação do pesquisador fez parte do seminário de encerramento, ocorrido em 19/12, das atividades de ensino e pesquisa do Cesteh neste ano. Abrindo a mesa Como anda o uso de agrotóxico no Brasil: os aspectos legais e os impactos na saúde e no meio ambiente, Ary Miranda, também coordenador do debate, disse que as consequências sofridas hoje no Brasil são provenientes de um deslocamento do processo de produção de commodities agrícolas do hemisfério norte para o hemisfério sul.
O debate contou com a participação da pesquisadora do Instituto Nacional de Controle de Qualidade de Saúde (INCQS/Fiocruz) Karen Friedrich e dos pesquisadores da ENSP Luiz Cláudio Meirelles e Lise Barros Ferreira. A pesquisadora do INCQS apresentou o Dossiê Abrasco: um alerta sobre os impactos do agrotóxico na saúde, desenvolvido pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) em parceria com diversas instituições, entre elas a Fiocruz. De acordo com Karen, o documento surgiu da constatação da magnitude do problema dos agrotóxicos no Brasil, de sua relevância para a saúde pública e das dificuldades do Estado em garantir o direito à saúde nesse campo, por meio de políticas públicas ágeis, adequadas e eficazes.
O objetivo do dossiê foi registrar e difundir a preocupação de pesquisadores, professores e profissionais com a escalada ascendente do uso de agrotóxicos no país e a contaminação do ambiente e das pessoas dela resultante, com severos impactos sobre a saúde pública. Além disso, o documento visou expressar o compromisso da Abrasco com a saúde da população, no contexto da reprimarização da economia, da expansão das fronteiras agrícolas para a exportação de commodities, da afirmação do modelo da modernização agrícola conservadora e da monocultura químico-dependente.
Segundo Karen, o Brasil está na ponta do consumo do agrotóxico. O dossiê também aponta que o Estado brasileiro, em seu pacote de financiamentos, estimula a venda de agrotóxico e de outros insumos químicos diretamente. Mas, de forma indireta, oferece isenção fiscal a esses produtos, e isso onera ainda mais os recursos públicos. “Por um lado temos um Estado que é forte na área de isenção fiscal, estímulo e financiamento, mas, ao mesmo tempo, promove algumas iniciativas como a reforma agrária, o incentivo à agroecologia e outras ações de combate a esse modelo”, alertou Karen. A pesquisadora informou que todos podem ler o dossiê, disponível on-line no site da Abrasco.
A pesquisadora da ENSP e representante da Escola no Fórum Estadual de Controle aos Impactos dos Agrotóxicos, Lise Barros Ferreira, detalhou os usos e as aplicações de agrotóxicos, praguicidas, pesticidas, biocidas e defensivos agrícolas encontrados no Brasil. Apesar de todos os estudos existentes na área, comentou a pesquisadora, não há ação governamental que garanta vigilância. “Pelo contrário, o que vemos é que, dia após dia, ela fica mais frágil, com menos dados. Com isso, efetivamos de forma pior o controle, a vigilância, a saúde e todas as maneiras de se lidar com a questão do agrotóxico. Esse problema vem de longa data, mas infelizmente só temos conseguido manter a estrutura ou piorar as estruturas existentes”, lamentou Lise.
De acordo com Lise, é preciso que os profissionais de saúde façam vigilância por sua própria lógica, envolvendo diferentes áreas: sanitária, epidemiológica e da saúde do trabalhador. “Precisamos trabalhá-las de forma articulada. Esse é o primeiro desafio que ocorre dentro da nossa própria área de trabalho. O segundo se refere às tentativas de iniciar um fórum estadual que junte todas as instituições que lidam com a questão das vigilâncias. Conseguimos isso agora: tivemos a primeira reunião em dezembro deste ano e o fórum já envolve 43 instituições. O terceiro desafio é fazer toda essa engrenagem funcionar, pois ainda encontramos ideias e interesses diferentes”, completou Lise.
Encerrando as apresentações, Luiz Cláudio Meirelles trouxe um conjunto de eventos que ilustram a atual situação do agrotóxico no Brasil. Segundo ele, nós devemos enfrentá-la. Luiz Claudio afirmou que a Fiocruz tem papel estratégico nessa luta pela sua independência e, portanto, deve tentar organizar algumas ações na área, mas que não desqualifiquem o trabalho construído até agora. Para ele, o movimento principal existente hoje no país de controle dessa área é de quem vende o agrotóxico e de quem planta, ou seja, os grandes agricultores e latifundiários. Com isso, disse Luiz Claudio, a sociedade fica completamente à deriva no debate, comendo aquilo que é determinado por eles.
“O papel do Estado é fundamental como regulador e controlador das possíveis contaminações. Sempre afirmo: o que buscamos é uma sociedade sem veneno. Trabalhamos para que, um dia, este setor não exista, pois então teremos produtos absolutamente seguros. Parece utopia, mas é o caminho”, defende ele.
Do ponto de vista regulatório, Luiz Claudio advertiu que, na última década, a questão dos agrotóxicos avançou muito. Mas ele alertou que, desde 2008, o número de empresas duplicou. Além disso, cerca de 50% delas são escritórios que não têm capacidade técnica para responder a problemas. Caso surja um problema, elas simplesmente fecham suas portas, e a conta do dano vai para o contribuinte.
Como desafios, ele citou a obtenção de financiamento permanente para garantir a capacidade analítica; implantação da análise fiscal; aumento da rastreabilidade das amostras; incentivo à realização de estudos e pesquisas independentes; desenvolvimento de pesquisas para geração de produtos de baixa toxicidade; incentivo à responsabilidade social das empresas sobre seus produtos; e produção de conhecimento sobre risco cumulativo.
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