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Estudo analisa produção científica em Saúde do Trabalhador
Abas primárias
“A saúde do trabalhador é uma área do conhecimento consolidada devido a diversidade de seus temas, objetos de pesquisa, métodos e técnicas encontrados no conjunto de sua produção científica.” A observação é da pesquisadora do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh/ENSP) Maria Cristina Strauz. Para ela, a produção científica requer determinadas regras que não incluem atributos importantes para o campo da Saúde do Trabalhador: o senso comum, o saber operário e os movimentos sociais.
De acordo com a pequisadora, embora a saúde do trabalhador tenha se constituído num campo específico do conhecimento, é também um tema transversal a diversas outras áreas, por sua complexidade e interdisciplinaridade. Em grande parte dos atuais 78 programas de pós-graduação em Saúde Coletiva há linhas de pesquisa ou sub-áreas em saúde do trabalhador, o que contribui para a consolidação deste campo de conhecimento.
Essas constatações surgiram a partir de sua tese de doutorado em Saúde Pública da ENSP intitulada Produção do conhecimento em saúde do trabalhador: um olhar a partir da Saúde Coletiva. A partir da pesquisa, foi concluido que a saúde do trabalhador configura um sistema complexo que aplica e produz conhecimento científico, buscando atender as demandas dos serviços de saúde, bem como dos movimentos sociais.
Confira, abaixo, a entrevista com a pesquisadora e conheça os principais resultados encontrados por ela a partir deste estudo.
Informe ENSP: Sua pesquisa teve como objetivo analisar a configuração e a dinâmica da Saúde do Trabalhador dentro do campo da Saúde Coletiva. Como foi feito esse estudo?
Cristina Strausz: Realizamos uma pesquisa bibliográfica sobre a produção científica em Saúde do Trabalhador, relacionando-a aos programas de pós-graduação em Saúde Coletiva. Especificamos, a partir da produção científica em Saúde do Trabalhador, os elementos que configuram o campo de conhecimento da Saúde Coletiva, através da identificação das disciplinas, categorias profissionais, temas e abordagens utilizadas.
Foi feito um estudo do tipo qualitativo, baseado em pesquisa bibliográfica e entrevistas, dividido em duas etapas complementares: a primeira trata-se de pesquisa sobre o estado da arte da produção científica em Saúde do Trabalhador no interior dos programas de Saúde Xoletiva, tendo como ponto de partida os Cadernos de Indicadores da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A segunda etapa discute a configuração da área temática Saúde do Trabalhador a partir de entrevistas com agentes históricos do campo considerados informantes-chave.
No site da Capes foi acessada a grande área de Ciências da Saúde através do menu 'Cursos recomendados e reconhecidos' e, dentro desta, a área de Saúde Coletiva. Trabalhou-se com o período de quatros triênios de avaliação, entre 1998 e 2009.
Foram observados, portanto, 23 programas, distribuídos geograficamente em 6 programas da região Nordeste; 13 programas na região Sudeste e 4 no Sul.
Informe ENSP: Como foi feita a seleção das publicações estudadas para sua pesquisa e quais foram os principais resultados encontrados a partir desta análise?
Cristina Strausz: Foram identificados inicialmente nos Cadernos de Indicadores da Capes 763 artigos no período de 1998 a 2009. Destes, foram excluídos 96 que, embora incluídos nos critérios iniciais, não foram encontrados. Desta forma, trabalhamos com um universo de 667 artigos, perfazendo uma média de 55,6 artigos por ano de estudo. Esta produção apresentou tendência crescente até o ano de 2007, quando foram publicados 95 artigos. Nos dois anos posteriores, a tendência foi de queda, com 85 artigos em 2008 e 77 em 2009.
Uma vez que a produção científica brasileira em geral, e em Saúde Coletiva em particular, apresenta tendência crescente ao longo dos anos, acreditamos que possa ter havido um rearranjo da produção científica entre os novos cursos, ainda sem avaliação no momento da pesquisa.
Por outro lado, as exigências sobre a qualidade na produção de artigos por parte das revistas, aliada aos estímulos dos programas de pós-graduação sobre seus docentes para o incremento da produção durante o triênio de 2007-2009, revelaram seus resultados no triênio de avaliação de 2010 a 2013, não incluído neste estudo.
Informe ENSP: Existe uma rede de pesquisa sobre a temática Saúde do Trabalhador? Como ela se apresenta?
Cristina Strausz: Encontramos 45 artigos vinculados a até quatro programas de pós-graduação em Saúde Coletiva, o que demonstra a colaboração entre pesquisadores de diversas instituições. Ao analisarmos a produção relativa ao número de autores por artigo, constatamos que apenas cerca de 10% possui apenas um autor, cerca de 64% deles de 2 a 4 autores e aproximadamente 26% entre 5 e 19 autores. Identificamos também 48 artigos em colaboração entre autores brasileiros e de universidades e instituições de pesquisa internacionais, além de 135 artigos em parcerias intelectuais e colaboração entre programas de Saúde Coletiva e o setor saúde em 29 artigos; entre programas de Saúde Coletiva e instituições governamentais externas ao setor saúde em 34 artigos; entre programas de Saúde Coletiva e outras instituições de ensino e pesquisa brasileiras não incluídas neste estudo em 68 artigos e entre programas de Saúde Coletiva e centrais sindicais/sindicatos, quatro artigos.
Complementarmente, em uma visita ao Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq em novembro de 2013 buscamos “saúde do trabalhador” como termo exato e obtivemos um total de 271 grupos de pesquisa. Ao aplicarmos o filtro restringindo a busca à grande área de Ciências da Saúde, obtivemos 181 grupos de pesquisa (87%), dos quais 77 (43%) pertencem à área de Saúde Coletiva. Este dado pode traduzir a grande influência da formação em Saúde Coletiva/Saúde do Trabalhador na pesquisa das demais áreas do conhecimento, com destaque para Enfermagem (48), Fisioterapia e Terapia Ocupacional (19) e Educação Física (11). Na área de Ciências Humanas (46), com destaque para Psicologia (28); em Ciências Sociais Aplicadas (22), com destaque para Serviço Social (9); e Engenharias (14), com destaque para Engenharia de de Produção (9).
Informe ENSP: Onde se concentram as publicações produzidas na área da saúde do trabalhador?
Cristina Strausz: A produção de artigos em saúde do trabalhador está distribuída em 180 periódicos, sendo 101 nacionais e 79 internacionais. A principal revista para a área é a Cadernos de Saúde Pública da ENSP, com 123 artigos, seguida da Revista Ciência & Saúde Coletiva, com 78 artigos, e a Revista de Saúde Pública, com 71 artigos. Essas três revistas concentram 40,8% dos artigos de saúde do trabalhador. A seguir, temos a Revista Brasileira de Saúde Ocupacional (26 artigos) e a Revista Brasileira de Epidemiologia (25 artigos). Ao contrário da grande concentração da produção divulgada em periódicos nacionais, a aceitação da produção da área de Saúde do Trabalhador em grande número de revistas estrangeiras fala a favor da alta qualidade da produção da área, pois 159 (24%) artigos foram publicados nesses 79 periódicos de diversos países.
Informe ENSP: Quais foram os principais desafios observados nessa área de produção?
Cristina Strausz: A demarcação teórica e metodológica que sustentou o campo inicialmente é hoje insuficiente para dar conta da velocidade com que o mundo do trabalho tem se transformado. Um dos entrevistados relatou que tem trabalhado com a ideia de simultaneidade e de co-produção para melhor explicar as novas formas de trabalho, mas há que se desenvolver mais teorias para entender a questão de gestão do trabalho do ramo de serviços. Consideram que os desafios da implementação da Saúde do Trabalhador nos serviços de saúde são os mesmas do SUS como um todo, mas que além dessas, há ainda a grande dificuldade da descentralização das ações, pois é uma área complexa e há muitas dificuldades para que os municípios assumam essas ações e enxerguem que a Saúde do Trabalhador é sua responsabilidade.
Após mais de 20 anos do SUS e do Movimento de Reforma Sanitária Brasileira, entendemos que a Saúde do Trabalhador só poderá cumprir o seu papel dentro de um sistema de saúde realmente articulado. Os esforços de capacitação da rede ainda são insuficientes e as experiências exitosas de intra e intersetorialidade ainda são pontuais. Embora haja investimento financeiro do governo e na própria reestruturação do sistema de saúde nos últimos anos, a incorporação da Saúde do Trabalhador no SUS ainda carece de estratégias eficazes. A vigilância das cadeias produtivas, como a do benzeno e o matriciamento em saúde do trabalhador são dois exemplos de estratégias eficazes, o primeiro vindo dos anos 90 e o segundo acompanhando o ordenamento atual do sistema de saúde.
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